A cidade do Porto está repleta de histórias, tradições, património e cultura que encantam residentes e turistas e atraem cada vez mais famílias de fora para viver ali. Mas nem todas conseguem pagar uma casa para morar no concelho do Porto, que está recheado, também, de oportunidades de emprego. Os preços das habitações quer para comprar, quer para arrendar estão em alta e muito acima dos rendimentos médios dos portugueses. E, perante este cenário, milhares de famílias estão a ser empurradas para os concelhos periféricos do Porto, onde procuram casas com melhor relação qualidade-preço, áreas maiores e espaços exteriores. A questão é que também nos municípios limítrofes da Invicta há falta de casas para comprar e arrendar para responder à procura, uma escassez que está a fazer disparar os preços da habitação, tal como mostram os dados analisados pelo idealista/news.
Em Portugal, existe um fosso entre os rendimentos médios das famílias e os preços das casas para comprar ou para arrendar. E esta é uma realidade ainda mais evidente nos grandes centros urbanos, como é o caso do Porto. Os dados do idealista indicam que a taxa de esforço para comprar casa no Porto é de 46% e para arrendar é preciso dedicar 45% do salário, tendo em conta o período entre o terceiro trimestre de 2022 e o período homólogo.
Com as despesas da casa a levarem boa parte dos orçamentos familiares no município do Porto, muitas famílias são forçadas a procurar casa noutros locais, nomeadamente nos arredores do Porto. Os dados dos Census 2021 mostram a maioria das 20 mil pessoas que abandonaram a cidade nos últimos três anos mudou para um concelho vizinho, segundo contava recentemente o Expresso. E, entretanto, esta tendência deverá ter-se acentuado, considerando o atual momento de alta inflação em Portugal e o crédito habitação mais caro.
“Cada vez mais as famílias estão e vão privilegiar o espaço exterior, que encontram nas cidades periféricas, em detrimento de centralidade”, Joaquim Santos, diretor comercial da Global Trade
“Com os orçamentos mais apertados, as famílias aliam este fator ao preço e tendem a deslocar-se para os arredores, onde atualmente existe uma oferta de qualidade quer ao nível de apartamentos como moradias”, explica ao idealista/news Hugo Marranas, diretor comercial e proprietário da Marranas Imobiliária, sediada a norte do país. Até porque, quando uma família procura uma habitação para morar “o fator que mais pesa continua a ser a localização”, frisa ainda o responsável. E é, por isso, que as famílias trocam o Porto, sobretudo, pelos municípios à sua volta, continuando, assim, perto destes grandes centros urbanos, onde há “abundância de serviços, transportes e comércio”.
Mas este não é o único motivo por detrás desta mudança de casa do Porto para os seus concelhos periféricos. Com a pandemia, “as pessoas passaram a ter uma noção de qualidade de vida que já não sentiam nas grandes cidades fruto das constantes diminuições dos espaços”, começa por analisar Joaquim Santos, diretor comercial da Global Trade, em declarações ao idealista/news. Ao ganhar esta consciência, as famílias começaram a “procurar as cidades pequenas e limítrofes do Porto, que distam poucos quilómetros dos grandes centros, pois aqui podem viver mais perto da natureza e dar muito mais conforto aos seus filhos”, realça. Além disso, escolher uma cidade nos arredores do Porto significa “fugir do caos turístico, do trânsito e da poluição”, acrescenta ainda Hugo Marranas.
Procura de casas dispara no arrendamento, mas não na compra
No Grande Porto, a procura de casas para arrendar disparou na reta final do ano em 16 dos 17 municípios, apontam os dados do idealista/data. Já no que toca ao mercado de compra e venda, observa-se que a procura subiu em oito concelhos e desceu em nove entre o quarto trimestre de 2021 e o mesmo período de 2022.
O mercado de arrendamento no Grande Porto está, portanto, em alta. A procura mais do que duplicou na maioria dos concelhos. Oliveira de Azeméis foi o município mais procurado para arrendar casa no final do ano (+868%), seguido de Paredes (+730%), São João da Madeira (+565%), de Valongo (+413%) e de Vila Nova de Gaia (+377%). “Verifica-se uma mudança no mercado imobiliário com uma procura sólida de arrendamento”, adianta o diretor comercial da Marranas Imobiliária, uma agência fundada em 2020. Por seu turno, Arouca foi o único concelho onde a procura de casas para arrendar caiu neste período.
Em contrapartida, a procura de casas para comprar aumentou, sobretudo, precisamente em Arouca (+575%) entre outubro e dezembro de 2022 face ao mesmo período de 2021. Oliveira de Azeméis é a segunda cidade periférica onde a procura mais subiu (+70%), seguida de Santo Tirso (+28%). Apesar de os preços das casas à venda estarem bem elevados na Invicta, a procura das famílias continua a crescer na cidade do Porto (+77%).
A tipologia predominante na procura é o T3, com espaços exteriores amplos, diz Joaquim Santos. Esta é uma tendência que também surgiu com a pandemia. Depois de passarem meses confinadas, as famílias passaram a procurar casas com zonas amplas, varandas maiores, espaços para escritórios. E estes tornam-se mesmo “alguns dos requisitos para a construção nova e também para remodelações”, acrescenta ainda Hugo Marranas.
Contudo – e ao contrário do que se observou na Grande Lisboa -, a procura de habitações à venda caiu em nove dos 17 concelhos vizinhos do Porto. A maior queda foi registada em Valongo e em Espinho (ambos com -35%), seguida da Trofa (-34%) e da Maia (-26%).
Subida dos juros está a abrandar procura de casas no Porto?
Este abrandamento da procura de casas para comprar em vários municípios da Área Metropolitana do Porto acabou por afetar os negócios, tal como explica Joaquim Santos, da Global Trade, que trabalha há dez anos no mercado imobiliário do Grande Porto.
A pressão que a guerra na Ucrânia tem colocado nos mercados financeiros está a refletir-se na subida dos custos no crédito habitação. E a subida de juros e da inflação “galopante” gerou um “esfriamento na decisão de avançar”, partilha o especialista. Em resultado, “o mercado claramente reagiu de forma negativa [a este cenário], trazendo para o mesmo um decréscimo de vendas, não porque não existam clientes, mas sim porque os mesmos sentem-se fora da sua taxa de esforço confortável”, diz ainda Joaquim Santos, salientando que em Gondomar – onde se realizam 85% das vendas da sua imobiliária – não existe procura de casa por estrangeiros.
Já Hugo Marranas conta que, apesar do contexto atual e dos preços das casas continuarem a subir mesmo nas periferias do Porto por efeito de contágio, na Marranas Imobiliária continuam a concretizar “um número de transações interessante e com um maior número de apartamentos. A procura direciona-se mais para os centros de Paredes e Penafiel”, destaca ainda.
No que diz respeito às casas em planta, a procura continua a existir nos municípios. Mas a dinâmica do mercado também está afetada pelo atual contexto. “No último semestre, quer os investidores e promotores imobiliários, quer os clientes têm optado por aguardar para ver o que vai acontecer com os preços dos materiais e os preços finais de venda”, alerta Joaquim Santos, admitindo que esta situação cria “um impasse no mercado”.

Há falta de oferta de casas para comprar e arrendar no Grande Porto
Na Área Metropolitana do Porto, a falta de oferta de casas quer para arrendar como para comprar é uma realidade. “Nos últimos quatro anos, assistiu-se a um retomar da construção de novos projetos, mas a verdade é que o número de casas novas é insuficiente para que a oferta possa equilibrar a procura”, afirma Joaquim Santos. Também Hugo Marranas indicou ao idealista/news que “poderá não existir tanta oferta de habitações quanto a procura, principalmente para arrendamento, tornando-se um desafio para as famílias e imobiliárias”.
No que diz respeito à oferta de casas à venda no Grande Porto, salta à vista que o stock caiu em 8 municípios, manteve-se em três (Valongo, Paredes e Gaia) e aumentou em seis. Foi em Vale de Cambra que a oferta de casas mais desceu no último trimestre de 2022 face ao período homólogo (-62%). Logo a seguir vem o município do Porto (-41%), seguido de Oliveira de Azeméis (-41%) e de Gondomar (-31%). Já os maiores aumentos da oferta de casas para comprar entre estes dois momentos foram registados na Trofa (+92%), em Arouca (+33%) e em São João da Madeira (+30%).
A verdade é que a oferta de casas para arrendar teve uma queda mais acentuada tanto no Porto (-52%), como nos seus concelhos vizinhos. Em Arouca caiu 100%, seguindo-se de São João da Madeira (-83%) e Matosinhos (-57%). Só em Valongo (+26%), em Gondomar (+5%) e Vila do Conde (+2%) é que houve mais casas para arrendar no final de 2022 do que no final de 2021. Em Vale de Cambra, o stock de habitações não variou entre estes dois momentos.
“Claramente, não existe mercado de arrendamento no Porto e nem nos concelhos limítrofes, o que faz disparar o valor das casas para arrendar”, constata o diretor comercial da Global Trade. E explica porquê: “O mercado do novo está a um valor tal, que se torna proibitivo colocar um imóvel novo em arrendamento, pois o valor do investimento leva a que haja uma baixa margem de rentabilidade”. E é por isso mesmo que “os poucos imóveis que aparecem no mercado são a valores bem acima do esperado”, remata o especialista, que não prevê que haja uma mudança no mercado que promova o equilíbrio entre a oferta e a procura.
Preço das casas à venda no Grande Porto a disparar
O atual contexto económico, marcado pela alta inflação e pela subida a pique dos juros no crédito habitação, terá influenciado o arrefecimento da procura por casas para comprar na maioria dos municípios que compõem o Grande Porto – pelo menos pelas famílias portuguesas. “A questão das taxas de juro veio colocar – e irá acentuar – um claro esfriar da subida dos preços. Levará a que cada imóvel leve mais tempo para ser vendido e irá aumentar a pressão sobre os operadores de venda”, acredita Joaquim Santos, da Global Trade.
Mas apesar de haver menor procura em determinadas zonas, os preços das casas à venda no Porto e nos seus municípios limítrofes continua a escalar, o que pode ser explicada pela grande escassez de oferta de habitação. Na Trofa, as casas ficaram 38% mais caras e o metro quadrado passou a custar 1.622 euros no final de 2022. Aqui comprar casa custa, em termos medianos, 170.000 euros. Valongo foi o segundo município periférico da cidade Invicta onde os preços mais subiram (+33%), de acordo com os dados do idealista/data.
A grande maioria dos municípios viu os preços das habitações à venda crescer mais do que no Porto (+10%). E só em Arouca é que as casas para comprar ficaram mais baratas entre o final de 2021 e o final de 2022: neste concelho os preços caíram 24%, para 1.250 euros/m2.
Comprar casa em Matosinhos, Espinho e na Póvoa de Varzim é mais caro do que nos restantes municípios vizinhos da Invicta, custando 3.077 euros/m2, 2.517 euros/m2 e 2.163 euros/m2, respetivamente. Como seria de esperar, é precisamente no concelho do Porto onde adquirir habitação é mais caro (3.357 euros/m2).
Já os municípios mais baratos para comprar casa no Grande Porto são Oliveira de Azeméis (1.041 euros/m2), Vale de Cambra (1.185 euros/m2) e Santa Maria da Feira (1.214 euros/m2), com base nos mesmos dados.
Arrendar casa no Grande Porto: que concelho escolher?
“Como não existe mercado de arrendamento no Porto e nem nos concelhos limítrofes, o valor do arrendamento dispara”, conclui Joaquim Santos. E é isso que mostram os dados relativos ao último trimestre de 2022 face ao período homólogo: as rendas das casas subiram em quase todos os municípios do Grande Porto.
Isto quer dizer que quem optar por arrendar casa no Porto (+42%) ou nos seus concelhos periféricos vai encontrar um mercado ainda mais caro. Em Santo Tirso, as rendas das casas subiram 59%, em termos medianos, fixando-se em 7,3 euros/m2 no final de 2022. Em São João da Madeira, as rendas aumentaram 41%, em Paredes 29% e em Vila do Conde 26%. Só mesmo a Trofa é que viu os valores das rendas descer 8% para 6,4 euros/m2.
O concelho do Porto apresenta as rendas mais caras de todas (15,3 euros/m2), seguido de Matosinhos (11,6 euros/m2), da Póvoa de Varzim (9,0 euros/m2) e da Vila Nova de Gaia (8,7 euros/m2).
Já as famílias que procuram uma casa para arrendar perto do Porto e não querem pagar muito podem colocar em cima da mesa Oliveira de Azeméis, que apresenta as rendas mais baixas de todas (4,7 euros/m2). Santa Maria da Feira (5,6 euros/m2) e São João da Madeira (6,3 euros/m2) também são opções a considerar. A renda mediana de uma casa típica nestas duas cidades varia entre 500 e 650 euros por mês.
Quais os desafios para o futuro residencial do Grande porto?
Um dos principais desafios que o mercado imobiliário se vai deparar em 2023 prende-se, sobretudo, com o abrandamento da venda de habitações. “Julgo que em 2023 o mercado vai suspender um pouco a venda de imóveis, devido à dificuldade na obtenção de crédito habitação, uma vez que as taxas de juro estão altas e a sua evolução é incerta. Mas acredito que quem tem capitais próprios para investimento continuará a comprar para arrendar”, antecipa Hugo Marranas.
E para evitar que haja quedas acentuadas nos preços, os promotores e outros profissionais do setor imobiliário têm um papel importante na evolução do mercado residencial, destaca Joaquim Santos, da Global Trade. O próximo ano “será de crucial importância, acima de tudo, para os promotores, pois vão ter de decidir entre aumentar os preços ou baixar as margens comerciais (…) teremos de passar por um ajustamento quer em políticas de financiamento, quer em novos produtos e novas formas de encarar o financiamento. Sem essa mesma vertente, não será muito fácil haver uma retoma no próximo ano, pois não se pode contar com o aumento do poder de compra mediante a subida dos rendimentos das famílias”, aponta.
Este cenário poderá ter reflexo no próximo ano, segundo diz o gerente e proprietário da Marranas Imobiliária: “Em 2024, preços das casas poderão mesmo descer, devido ao mercado estagnar e devido às dificuldades em pagar o crédito. Isto poderá acontecer por via do aumento da oferta”, conclui. Já no mercado de arrendamento, o especialista antevê que os preços vão subir, até porque “neste momento temos muitos clientes a comprar a pronto pagamento para depois arrendar”.
