Poupança sobe e juros descem: é boa altura para pedir crédito da casa?

O clima económico em Portugal está a dar claros sinais de mudança, tendo voltado a máximos de 2023, segundo os dados mais recentes do INE. Com o mercado de emprego forte, a inflação mais baixa e o custo de vida mais barato, as famílias estão a conseguir poupar mais, e consequentemente a confiança dos consumidores também está a aumentar. Acresce que os juros nos créditos habitação inverteram o ciclo de subidas e estão a cair há vários meses, acompanhados pelas Euribor. Mas os preços das casas continuam a subir, em termos medianos, tanto para comprar como para arrendar, e sem o acompanhamento real dos salários. Será esta então uma boa altura para investir na compra de casa com recurso a financiamento bancário? Ou será melhor rentabilizar o dinheiro poupado nos depósitos a prazo?

Não há uma resposta única para esta questão e depende do contexto particular de cada família ou investidor, além do cenário económico e financeiro. Para ajudar na tomada de decisão, o idealista/news passou a pente fino a evolução das taxas de juro e a oferta de crédito habitação,bem como as alterações nas remunerações dos depósitos a prazo, contando com o contributo de especialistas.

  1. Juros estão a descer: como fica o crédito habitação?
    1. Oferta de crédito habitação vai mudar?
    2. Como escolher o crédito habitação?
  2. Depósitos a prazo: quanto rende colocar o dinheiro no banco?
    1. Vai render mais ou menos ter poupanças no banco?

A tempestade económica provocada por uma elevada inflação e altos juros no crédito habitação parece estar a dissipar-se, pouco a pouco, durante 2024. E isto porque a determinação do Banco Central Europeu (BCE) em travar a inflação na área euro deu frutos, de tal forma que o regulador liderado por Christine Lagarde já avançou com dois cortes nas suas taxas de juro diretoras em junho e setembro – e aguardam-se mais reduções, tendo mesmo pedido flexibilidade na política monetária.

Tudo isto acaba por tocar nos bolsos das famílias portuguesas, bem como dos investidores no setor imobiliário. A descida da inflação em Portugal nos últimos meses, a par de um maior crescimento do rendimento disponível elevou a taxa de poupança das famílias entre abril e junho deste ano para 9,8%, revelou o Instituto Nacional de Estatística (INE). E este aumento da poupança impulsionou a capacidade de financiamento das famílias para 3,4% do PIB nesse mesmo período.

Agora, resta saber o que fazer às poupanças. As hipóteses são muitas, desde comprar um carro até fazer aquela viagem de sonho há muito planeada. Em alternativa, pode-se decidir avançar com a compra de casa para viver, uma segunda residência ou um imóvel para colocar no mercado de arrendamento como fonte de rendimento, usando esse fundo de reserva como entrada para um crédito habitação. Mas também se pode optar por deixar o dinheiro a render no banco. Antes de tomar qualquer decisão, descobre como estão a variar os juros e a oferta nestes dois produtos bancários (crédito da casa e depósitos a prazo), que são dos mais utilizados em Portugal.

Crédito habitação em Portugal
Foto de Mikhail Nilov no Pexels

Juros estão a descer: como fica o crédito habitação?

Investir as poupanças na compra de casa é uma decisão importante na vida das famílias, até porque além de implicar uma elevada taxa de esforço, em geral, trata-se de um compromisso de longo prazo. E, por isso, importa estudar bem o mercado antes de avançar com a aquisição, para perceber como estão a variar as taxas de juro no crédito habitação e qual é a oferta bancária disponível agora e num futuro próximo.

Ao olhar para os dados mais recentes do Banco de Portugal (BdP), salta à vista que a taxa de juro nos novos créditos habitação está a descer desde o final do ano passado, fixando-se em 3,56%, em média, no mês de julho. Esta é uma boa notícia, uma vez que quem avançar com um empréstimo para comprar casa pagará prestações mais baixas.

A redução nos juros dos novos créditos habitação em Portugal surge numa altura em que os mercados financeiros já estavam a antecipar os cortes das taxas diretoras pelo BCE, que só se concretizaram no verão. E este decréscimo é o reflexo da evolução dos juros nas principais tipologias de empréstimos utilizadas no nosso país:

  • Créditos habitação a taxa variável: as taxas Euribor já estão a cair para todos os prazos desde o final de 2023, descendo as prestações da casa nos novos créditos habitação em dezenas de euros, tal como explicamos aqui. A Euribor a 12 meses fixou-se em 3,166% em agosto e a Euribor a 6 meses em 3,425%;
  • Créditos habitação a taxa mista: para atrair mais clientes, os bancos em Portugal têm lançado campanhas de créditos a taxa mista mais acessíveis (que fixam a prestação num período inicial do contrato, seguido de um período a taxa variável). Esta é uma forma das famílias terem estabilidade financeira, pelo menos, no curto prazo, motivo que terá levado a que a taxa mista tenha passado a representar a maioria dos novos créditos habitação própria e permanente no nosso país (74% do total em julho).

Com esta oferta hipotecária diversa e juros mais baixos, houve também maior concessão de capital para comprar casa: o montante de novos créditos habitação totalizou 1.284 milhões de euros em julho, um valor superior ao registado no mês anterior (1.275 milhões), indicam os dados do regulador.

Oferta de crédito habitação vai mudar?

Este é o atual panorama do mercado hipotecário em Portugal. E os especialistas ouvidos pelo idealista/news admitem que a oferta de crédito habitação não deverá ter mudanças significativas no curto prazo. “Enquanto exista uma perspetiva de descida de taxas, as ofertas de taxa mista continuarão a ter peso nas ofertas dos bancos, uma vez que os clientes podem beneficiar no imediato da tendência de descida dos indexantes”, indica Miguel Cabrita, responsável pelo idealista/créditohabitação em Portugal.

Mas tudo indica que a Euribor deverá continuar a descer, terminando 2024 em torno dos 3%, tal como antecipam os analistas da Ebury Portugal, apesar de sublinharem “a elevada a incerteza sobre a situação do indicador no final do ano”, que se prende sempre com o ritmo de descida dos juros do BCE (e até da Fed dos EUA). E há também analistas a estimar que a Euribor se possa situar abaixo dos 3% ainda este ano, baixando ainda mais as prestações da casa nos créditos habitação a taxa variável.

O Bankinter, por exemplo, estima que o custo do crédito habitação deverá continuar a baixar, prevendo que a Euribor a 12 meses desça para 2,75% em dezembro deste ano. O indexante no prazo mais longo deverá cair para 2,5% em 2025 e 2,75% em 2026. E a Euribor a 3 meses deverá fixar-se nos 3,25% em 2024, 2,75% em 2025 e 2,5% em 2026.

É neste contexto que Miguel Cabrita admite que vai chegar a altura em que “as ofertas de taxa variável vão aproximar-se das taxas mistas e os clientes que optem por esta modalidade será por procurarem estabilidade nos primeiros anos do seu crédito e não por antecipar uma descida do indexante”.

Portanto, o crédito habitação a taxa variável e a taxa mista deverão continuar a fazer parte das ofertas bancárias em Portugal. Mas haverá ajustes significativos nas suas políticas comerciais, como a “guerra de spreads” sentida num passado recente? Sobre este ponto, a opinião dos especialistas divide-se.

Há quem antecipe que os bancos não vão fazer grandes mudanças na sua oferta hipotecária, porque correm o risco de sobreaquecer o mercado, numa altura em que continua a haver apetite por comprar casa, dada a maior estabilidade do emprego, mais poupanças e menos inflação. “Até que vejam um caminho claro para a política monetária, os bancos não vão correr o risco de entrar numa guerra hipotecária e de sobreaquecer o mercado”, afirma Marcelo Siqueira, diretor de operações da corretora hipotecária Bayteca, citado pelo espanhol Cinco Días.

Já Juan Antonio Mora, CEO do grupo JAMSA, acredita que, com a descida dos juros, “os bancos tenderão a oferecer melhores condições hipotecárias [não só a taxa mista, como hoje se verifica], ampliando o acesso ao crédito e facilitando a aquisição de habitação a mais pessoas”, disse ao idealista/news.

Oferta de créditos habitação e depósitos
Foto de Sora Shimazaki no Pexels

Como escolher o crédito habitação?

Depois de explorar o mundo do crédito habitação em Portugal, há uma questão que surge no seio dos agregados: como escolher o melhor empréstimo para comprar casa? Não há uma resposta única para esta questão, porque há muitos fatores a considerar que variam de família para família.

“O crédito habitação é um meio para adquirir um imóvel, pelo que a necessidade ou momento para recorrer a um empréstimo para a compra de casa advém da necessidade/momento em adquirir um imóvel. Por isso, o empréstimo deve ser devidamente ponderado e ajustado à realidade de cada família”, considera Miguel Cabrita.

Além de analisar o contexto económico e financeiro, há vários pontos que as famílias devem ter em conta na hora de escolher um crédito habitação, como:

  • Fazer simulações com vários tipos de taxas de juro (variável, mista e fixa);
  • Calcular o peso das prestações da casa nos orçamentos familiares (taxa de esforço);
  • Ver capacidade de endividamento (se há outros créditos a pagar e se é possível pagar mais um);
  • Analisar folga orçamental caso as prestações da casa subam (na taxa variável ou taxa mista, quando passar a variável);
  • Ver margem para negociar o spread com o banco;
  • Analisar a possibilidade de dar uma maior entrada no crédito habitação, reduzindo a percentagem de financiamento (prestação da casa pode descer ou então paga-se o crédito em menos anos).

A par de tudo isto, os jovens até 35 anos podem ainda ponderar aderir àgarantia pública, que dá financiamento a 100% (mas também aumenta o esforço). Esta medida já está em vigor e regulamentada, mas só deverá começar a ser aplicada no final deste ano ou no início do próximo. Além disso, os jovens devem considerar ainda a isenção do IMT e Imposto do Selo para a aquisição da primeira habitação, já que os vai ajudar a poupar milhares de euros.

Como escolher o crédito habitação
Foto de Monstera Production no Pexels

Depósitos a prazo: quanto rende colocar o dinheiro no banco?

À semelhança o que aconteceu com os juros no crédito habitação, as instituições bancárias também acabaram por baixar as remunerações nos depósitos a prazo em Portugal antecipando os cortes dos juros do BCE. “A descida da taxa de juro tem impacto não só na redução do que se paga nos empréstimos com taxa variável, mas também na redução da remuneração dos depósitos a prazo”, refere o responsável pelo idealista/créditohabitação em Portugal.

Esta redução tem sido bem visível no nosso país: “A taxa de juro média dos novos depósitos a prazo de particulares diminuiu pelo sétimo mês consecutivo, passando de 2,66%, em junho, para 2,63% em julho”, revelou o BdP na nota estatística publicada no início de setembro.

Como a taxa do BCE aplicada aos depósitos (3,5% em setembro) está mais baixa agora do que se prevê que vá estar num futuro próximo, os depósitos com prazos mais curtos são os que estão a oferecer melhores rendimentos (embora cada vez mais baixos). Isso é bem visível nos dados do BdP de julho:

  • Novos depósitos com prazo até 1 ano: a taxa de juro média diminuiu 0,03 pontos percentuais (p.p.), para 2,65%;
  • Novos depósitos de 1 a 2 anos: a remuneração média também diminuiu para 1,99%
  • Novos depósitos a mais de 2 anos: a taxa de juro média aumentou 0,38 p.p., para 1,97%;

Tendo em conta as taxas fixadas em julho, uma família que decida colocar 10.000 euros num depósito até 1 ano vai rentabilizar 265 euros brutos. Se o mesmo valor for aplicado num depósito com prazo superior a 2 anos, conseguiria amealhar 197 euros a cada doze meses (ou seja, menos 68 euros por ano).

Mesmo com os juros a cair nos prazos mais curtos, os residentes em Portugal continuam a querer guardar as suas economias nestes produtos financeiros – e até atingiram um novo máximo. “O montante de novas operações de depósitos a prazo de particulares aumentou 2.498 milhões de euros, totalizando 12.559 milhões em julho, o valor mais elevado da série histórica”, destaca o BdP. E a grande maioria dos novos depósitos em julho (97%) foram de até 1 ano, que é onde as remunerações são mais vantajosas.

Taxas de juro dos novos depósitos das famílias

Juros médios por prazo acordado

20222022202220232023202320232024202420240,00,51,01,52,02,53,0%

Vai render mais ou menos ter poupanças no banco?

Será que vai compensar mais colocar o dinheiro nos depósitos a prazonum futuro próximo? Ao que tudo indica, os juros estão a seguir a tendência de descida consoante o BCE alivia a sua política monetária.

“Os balanços dos bancos mostram que a sua principal fonte de financiamento são os depósitos de clientes e as contas à ordem, pelo que devem manter um certo incentivo comercial nas taxas para um financiamento mais estável”, embora não significativo, acreditam Carlos Marcos e Breogán Porta, sócios responsáveis ​​pelo setor bancário na Forvis Mazars, citados pelo jornal espanhol.

Mas há quem tenha uma visão diferente. Luis de Guindos, vice-presidente do BCE, avançou no início do verão que os depósitos poderão ser relançados, porque as instituições bancárias já não têm tanto dinheiro excedente e os programas do regulador europeu que facilitavam o financiamento já terminaram. “Isto levará, no nosso ponto de vista, a mais concorrência e a que os bancos passem a competir mais por depósitos”, declarou Guindos.

A verdade é que o nosso país continua na cauda da Europa no que toca aos juros dos depósitos. “Em julho, Portugal desceu um lugar entre os países da área do euro, sendo agora o país com a quinta taxa mais baixa (2,63%)”, revelou o BdP, indicando que a taxa média no conjunto dos países da área do euro foi de 3%. E mesmo quando os juros do BCE estavam mais elevados, Portugal continuou nos últimos lugares nas remunerações dos depósitos, permanecendo baixos. Isto deve-se à elevada liquidez dos bancos no nosso país, a par da elevada procura por depósitos a prazo (está em máximos), que acaba por não estimular a oferta de remunerações mais atrativas.

Junte-se à discussão

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.

Compare listings

Comparar